terça-feira, 4 de agosto de 2009

O xadrez como espelho da personalidade




Escrito pelo Grande Mestre Internacional Rafael Leitão (na foto em Turim-Itália, com a medalha de prata nas Olimpíadas de Xadrez)



O xadrez, além de um esporte, é também uma forma de expressão intelectual e artística. Como tal, reflete caracterísitcas da personalidade do jogador. O estilo de jogo de um enxadrista é equivalente ao seu estilo de vida, a seu temperamento. Uma pessoa expansiva não se contenta com o domínio de apenas uma parte do tabuleiro, um destemido procura ataques mesmo se eles não existem, um egoísta pensa apenas nas suas possibilidades, um cauteloso nunca rechaça uma linha de empate, e por aí vai.


Neste sentido, pode-se fazer uma divisão entre dois tipos de enxadristas: os racionais e os intuitivos. Dentre os primeiros estão aqueles que tomam suas decisões baseadas em um cálculo minucioso ou uma estratégia refinada. Dificilmente escolhem continuações imprevisíveis. Trata-se de um estilo bem matemático, científico.


Alguns dos grandes campeões mundiais tinham essa visão sobre o xadrez, como Fischer ou Kasparov. Os intuitivos não se preocupam em calcular longas variantes, seguem seu instinto, seu coração. Às vezes ressentem-se da profundidade dos racionais, mas são mais práticos que eles. Dentre os seguidores deste estilo, alguns brilhantes jogadores como Tal, Petrosian e Karpov, três ex-campeões mundiais.


Um dos segredos da escola russa é diagnosticar desde cedo a predileção do jogador por decisões racionais ou intuitivas. Mark Dvoretsky, renomado treinador, mostrou-me em 2002 uma série de exercícios de avaliação, que são utilizados com jovens talentosos. Mas como se desenvolve este diagnóstico? Qual o sentido destes exercícios?


Acontece que no xadrez, assim como na vida, nem sempre existe uma única solução para um determinado problema. Não são poucos os casos em que dois ou até mais caminhos são equivalentes. E esta decisão, por simples que possa parecer, denota o estilo de cada um.


Estes exercícios buscam, através de uma repetição destas decisões, definir se o jogador é racional ou intuitivo. Com base nesta preciosa informação, todo um sistema de treinamento é formulado. Este complexo método tem sido um dos responsáveis pelo desenvolvimento de muitos jovens promissores a renomados grandes-mestres.

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